A 27ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), realizada em Sharm El-Sheikh, no Egito, deixou como marco histórico a criação de um fundo de perdas e danos, uma reivindicação de mais de 30 anos dos países mais vulneráveis. Além de ser um passo importante em direção à justiça climática, o acordo carrega o simbolismo de ter sido definido na África, continente cujos países estão entre os que mais sofrem os impactos das mudanças climáticas – embora, ao contrário dos países desenvolvidos, não tenham contribuído significativamente para as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera.
A participação brasileira na COP27 emitiu sinais de que o país está disposto a voltar a ter influência nas discussões em torno do tema do clima, o que, para o Brasil, significa ter de lidar com a questão amazônica. A presença dos governadores da Amazônia Legal, reunidos em um hub voltado ao debate sobre a região, as falas do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, e a proposta para que a Amazônia seja a sede da COP30, em 2025, evidenciaram o compromisso do país com o território.
Em Sharm-El Sheikh, a participação da sociedade civil brasileira nas mesas de debate e nos corredores da conferência seguiu marcante e ainda mais forte. O destaque deste ano foi para a ampliação do espaço conquistado pelos povos originários, quilombolas, ribeirinhos, negros, periféricos e da juventude.
“A sociedade civil demonstrou uma postura resiliente, construída nos últimos anos diante do pouco interesse do governo federal nas pautas climática e ambiental. Nesse período, ela reforçou a geração de conhecimento sobre o tema e, o que é muito relevante, aprendeu a se articular politicamente”, destaca Renata Piazzon, diretora do Instituto Arapyaú e secretária executiva da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia. Izabella Teixeira, conselheira da presidência da COP, participante da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia e fellow do Instituto Arapyaú, reforça: “Neste ano, as interlocuções passaram a ser políticas entre sociedade, governos subnacionais e equipes de transição. É uma sinalização muito concreta do amadurecimento das discussões de longa data da sociedade civil”.
Parte desse movimento, a Concertação lançou internacionalmente o documento “100 primeiros dias de governo: propostas para uma agenda integrada das Amazônias”. Baseada no tripé proteção ambiental, desenvolvimento econômico e justiça social, com propostas para o Poder Executivo federal e estadual e o Congresso Nacional, a agenda traz um olhar sistêmico para a Amazônia. Elaborado de forma colaborativa por mais de 130 pessoas, o trabalho traz propostas em diversas áreas, que vão de saúde, educação e segurança pública a ordenamento territorial, combate à fome e ciência, tecnologia e inovação.
O documento foi apresentado em eventos e entregue a lideranças internacionais e nacionais, além do presidente eleito e membros da equipe de transição do novo governo.
A Concertação foi ainda uma das organizadoras de um painel realizado no espaço oficial da Convenção-Quadro das Nações Unidas para a Mudança do Clima (UNFCCC), que teve como tema “O Brasil pode ser um líder global em clima novamente? O papel da Amazônia nas emissões líquidas zero do Brasil”.
Nele destacou que o Brasil precisa enfrentar o desmatamento, principal fonte das emissões de gases de efeito estufa do país. A conservação da Amazônia é parte importante da solução, mas deve ser conjugada a um plano maior de desenvolvimento para a região, que coloque as populações amazônicas como uma das prioridades. “Acabar com o desmatamento é resultado de um processo amplo e sistêmico, que promova o bem-estar das populações que vivem no bioma. As agendas social e econômica são tão importantes quanto a ambiental”, disse Renata Piazzon.
Para Roberto Waack, cofundador da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia e presidente do conselho do Instituto Arapyaú, “a agenda integrada para a Amazônia apresentada no documento traz o conceito de que a crise climática lida com questões que extrapolam, de longe, as ambientais. Envolve segurança alimentar, justiça social e paz”.
A Concertação deve, agora, dar continuidade ao diálogo iniciado na COP com membros da equipe de transição do novo governo, para melhor apresentar e debater as 14 propostas para a agenda integrada para a Amazônia, que estão no documento dos 100 dias.
A iniciativa também acompanhará a evolução dos debates e negociações da COP15 da Biodiversidade, que começa no dia 7 de dezembro, em Montreal, no Canadá. A Amazônia, por seu papel fundamental para o clima global e por abrigar uma das mais ricas biodiversidades do planeta, é um ponto de conexão entre as duas agendas.
“Ao mesmo tempo que carrega a responsabilidade de que, sem buscar alternativas para acabar com o desmatamento não é possível limitar o aquecimento do planeta em 1,5ºC, a região, por ter a maior biodiversidade do mundo, também guarda inúmeras alternativas para setores decididos a fazer a transição para uma economia de baixo carbono”, resume Roberto Waack, em artigo escrito em autoria com Renata Piazzon e publicado no site Um Só Planeta após a COP do Clima. O texto explica como o acordo sobre perdas e danos está relacionado à Amazônia e à biodiversidade e, em especial, o papel das Soluções Baseadas na Natureza (SbN) no cumprimento de metas de redução de emissões por parte, principalmente, do setor privado.
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