Durante a COP 27, em novembro do ano passado no Egito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antes mesmo de tomar posse, anunciou em seu discurso a criação da Cúpula da Amazônia. O intuito, segundo ele, era permitir que, pela primeira vez, os países que abrigam o bioma amazônico – Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela – pudessem “discutir de forma soberana a promoção do desenvolvimento integrado da região”.
O encontro, que vai acontecer no início de agosto, em Belém (PA), busca retomar o diálogo entre os países amazônicos e definir compromissos para o desenvolvimento da região. O evento reposiciona o Brasil na arena internacional dos fóruns sobre desenvolvimento. Isso porque o país vai sediar ainda a Cúpula do G20, em 2024, e a 30ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 30), em 2025, também na capital paraense.
A expectativa em torno do encontro foi tema do debate “Diálogos rumo à Cúpula da Amazônia: uma abordagem integrada de desenvolvimento”, promovido pela rede Uma Concertação pela Amazônia em parceria com o jornal O Estado de S. Paulo, no dia 15 de junho. Na conversa, representantes de povos originários, do governo, do empresariado e da sociedade civil destacaram o que esperam do evento.
A diretora do Departamento de Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, Maria Angélica Ikeda, enfatizou a importância da cooperação internacional. Segundo ela, o encontro reafirma o compromisso do governo federal de enfrentar os desafios comuns a todos os países da região, como o combate ao desmatamento, à degradação e a crimes ambientais, e a necessidade de proteção da vida, em todas as suas formas. “Por isso esta Cúpula está sendo realizada. Não por outro motivo, o governo revitalizou o PPCDAm [Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal], e a metade dos primeiros atos legislativos que assinou ao assumir tem a ver com proteção ambiental.”
Vanda Witoto, liderança indígena e profissional de saúde, chamou atenção para o resguardo do território e a segurança das populações indígenas. Para ela, a Cúpula precisa pensar em dar garantia de vida às pessoas que, de forma milenar, ancestral e espiritual, protegem as florestas, a terra, os rios e a sociobiodiversidade. Essa é uma condição para se avançar em outros temas, como o acesso à Educação, Saúde e Ciência e Tecnologia.
A líder indígena afirmou que hoje já se reconhece a contribuição dos Territórios Indígenas no enfrentamento das mudanças climáticas, mas que é necessário ir além do reconhecimento. Embora prestem serviços ambientais valiosíssimos, essas populações ainda estão alijadas da prosperidade. “A dicotomia entre a riqueza da Amazônia e a pobreza em que essas pessoas estão imersas é um dos grandes problemas a resolver.”
Indicadores como expectativa de vida, de saúde e de educação da Amazônia brasileira, tanto indígenas quanto não indígenas, são bem menores do que a média nacional. “Na Amazônia as pessoas morrem cedo, [no mesmo] nível da África subsaariana. Nenhuma política vai ser possível enquanto a gente não conseguir ter uma visão de futuro”, afirmou Denis Minev, CEO do Grupo Bemol, sediado em Manaus.
Na visão de Minev, falta ambição nacional no que diz respeito à Amazônia. “Reduzir o desmatamento não é uma grande ambição. Ambição é imaginar o que o futuro pode trazer.” O empresário lembrou que o Brasil já teve essa ambição ao criar o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), a Embraer e toda uma indústria aeroespacial ou quando pensou a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que ajudou a fazer do país uma potência agrícola. “Hoje, quais serviços vamos prestar ao mundo enquanto nós também nos beneficiamos?”, questionou.
Diante de todas essas perspectivas, Lívia Pagotto, secretária executiva da Concertação destacou o necessário desenvolvimento de alternativas econômicas, desde as tradicionais até as mais inovadoras, tendo como centralidade o bem-estar das pessoas que vivem na Amazônia. Pensar em uma agenda verdadeiramente integrada para o desenvolvimento da região, segundo Lívia, começa por reforçar o pilar ambiental de comando e controle, especialmente o combate ao desmatamento e à degradação florestal, e o avanço em monitoramento – mas não se esgota aí. Não há como discutir as questões ambientais sem enfrentar também os desafios sociais e econômicos.
A agenda integrada, defendida pela Concertação, busca uma visão de prosperidade econômica, de melhoria de vida das pessoas, de conservação ambiental e uso sustentável de recursos naturais. Para Lívia, é importante avançar na agregação de valor e na inovação, conectando o conhecimento das Amazônias, a cultura produtiva local e o mercado, para que novas economias possam se tornar vantajosas já no curto prazo.“Se quisermos colocar a Amazônia nos nossos corações e no centro do nosso debate enquanto País, será preciso ir até lá, conversar com as pessoas locais e também reunir quem está interessado em debater o futuro da região. Esse é o espírito da Concertação: colocar todas as pessoas que se interessam e se importam com a Amazônia juntas para pensar em formas para o futuro”.
Confira a cobertura completa na Página22.
Assista à gravação do evento:
DESTAQUES NO CHAT DO EVENTO
“A janela de oportunidades é agora. Investimentos que se movem rapidamente e que querem vir para a Amazônia não devem ser perdidos. O valor já é percebido, há de se ter pressa”
– Horácio Lafer Piva, empresário e ex-presidente da Fiesp
“A Cúpula é muito importante, pois é necessária uma abordagem integrada da Amazônia continental, tendo como referência a imensa bacia hidrográfica”
– José Carlos Carvalho, consultor e ex-ministro do Meio Ambiente
“Necessitamos da integração das autoridades de segurança pública dos países amazônicos na busca de ações coordenadas para combate aos ilícitos ambientais”
– Mauro Luis Ruffino, da OCTA
“Fundamental retomar e fortalecer a cooperação entre universidades e centros de pesquisa pan-amazônicos, evitando uma posição hierárquica brasileira sobre os demais países”
– Roberto Porro, pesquisador na Embrapa
“Vamos avançar com a ideia do Instituto de Tecnologias da Amazônia (AmIT), Pan-Amazônico e padrão MIT”
– Carlos Nobre, cientista na Academia Brasileira de Ciências
“Creio que precisamos colocar a Amazônia de modo sério e na direção correta, nos orçamentos público federal e privados do Brasil”
– Paulo Bellotti, fundador da MOV Investimentos
“Fundamental esse olhar das diferentes Amazônias, para pensar em estratégias locais diferenciadas nesse território que representa metade do país”
– Marcia Soares, do Fundo Vale
“Temos o potencial de pautar o mundo e fazê-lo nos seguir neste novo modelo de negócio sustentável de fato”
– Joanna Martins, empresária na Manioca
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