Há dois meses, o Arapyaú participou, com vários parceiros, do lançamento de duas grandes iniciativas na cadeia do cacau: o Fundo Kawá e o Cacau Brasileiro. Por que elas são importantes?
O Kawá, que vai facilitar o acesso a crédito e assistência técnica para os pequenos produtores agroflorestais, aglutina toda a história e experiência do Arapyaú na cacauicultura. Ao longo dos anos, constituímos e fomentamos muitas organizações que hoje fazem parte dessa iniciativa. Estamos começando a pegar evidências de créditos de biodiversidade e de carbono para esse ecossistema e fazer do Kawá um hub de conexão entre produtores, financiadores, indústria e filantropias. O Kawá é construído com uma metodologia que agrega recursos, gera renda no campo, mantendo a floresta em pé, e potencialmente levando outros serviços para as comunidades. Se conseguirmos ter sucesso com essa experiência no cacau, podemos adaptá-la segundo as especificidades de outras cadeias. Isso seria o sucesso.
Já o Cacau Brasileiro é uma iniciativa setorial para mostrar ao mercado global que nosso produto é sustentável, que cumpre a legislação da União Europeia e tem rastreabilidade. É justamente para comprovar que produzimos de uma maneira que preserva e gera renda para quem mais precisa, com potencial futuro de restauração de áreas degradadas. Com esse posicionamento internacional, a expectativa é conseguir atrair mais investimento, com esse olhar de inclusão e sustentabilidade, para a expansão de áreas de cultivo em sistemas agroflorestais.
Você mencionou créditos de biodiversidade. O que são eles e por que estão no radar do Arapyaú?
A discussão sobre créditos de biodiversidade ainda é bastante embrionária em todo o mundo, mas é uma ideia que vem ganhando força como maneira de direcionar recursos privados para a conservação e restauração da natureza. Esse crédito é gerado a partir de resultados positivos na preservação ou restauração da diversidade biológica em uma determinada área, dentro de um período de tempo. A gente não sabe muito bem como esses créditos serão mensurados nem qual metodologia será adotada mais amplamente, mas temos usado nossa experiência de campo em biodiversidade e embasamento técnico para construir parcerias que ajudem a nos inserir nesse debate global e testar maneiras de monetizar esse ganho de biodiversidade para os produtores.
Uma dessas experiências foi a geração de créditos de empoderamento feminino, no Padrão W+, para gerar renda para trabalhadoras no campo. Quais foram os resultados?
As evidências mostram que as mulheres não só gerenciam melhor as propriedades, mas também investem os rendimentos adicionais em benefício das próprias comunidades e das famílias. Essa capacidade de gerar impacto positivo é justamente o que o Padrão W+, desenvolvido pela Women Organizing for Change in Agriculture and Natural Resource Management (WOCAN), busca valorizar e monetizar. Primeiro, oferecemos crédito e assistência técnica para melhorar a produtividade e aumentar a renda, o que nos permite mensurar os impactos específicos gerados para as mulheres e, a partir disso, emitir os créditos de empoderamento. Quando eles são vendidos, as mulheres recebem uma renda adicional, gerando um círculo virtuoso.
A ERA Brazil, desenvolvedora de impacto que foi parceira do Arapyaú nesse projeto, calcula que cada crédito representa uma melhoria de 10% na qualidade de vida de uma mulher e é negociado por US$20. É um investimento auditado, verificado, tem comprovação. Mas ainda falta mercado. É preciso que os debates sobre créditos de biodiversidade e inclusão avancem em todo o mundo para que se estabeleça quais metodologias serão mais aceitas e consigamos avançar com mais iniciativas como essa.
No último ano, o Arapyaú se consolidou no cenário da filantropia global e firmou parcerias internacionais, como o UK Pact, consórcio de cerca de cerca de R$6,3 milhões, que vai ajudar a construir políticas nacionais para a bioeconomia. Por que essas colaborações são importantes?
Precisamos dessas trocas para entender o ambiente internacional que está se constituindo com novas legislações sobre desmatamento, por exemplo, e como podemos nos preparar para atender demandas futuras nessa agenda. É necessário entender o contexto e abrir portas para o diálogo. Além disso, parte dos investimentos para alavancar a bioeconomia no Brasil vai depender de atores privados e filantropia internacionais. Precisaremos desses recursos para escalar soluções baseadas na natureza. O país tem o potencial de fazer muitas coisas, já que conta com políticas públicas, um sistema bancário robusto e certa segurança jurídica. Os acordos multilaterais podem nos ajudar a destravar obstáculos em agricultura regenerativa ou restauração florestal, por exemplo. E, como sempre, o Arapyaú está mais do que disposto a construir pontes para fazer isso acontecer.