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Para diretora da RAPS, políticos têm papel fundamental no enfrentamento das mudanças climáticas no Brasil

Em entrevista, Mônica Sodré analisa a importância da democracia, do pluripartidarismo, da diplomacia e da ação do poder público para enfrentar desafios socioambientais do país e do mundo. Foto: Arquivo RAPS

No mês de junho, a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) se tornou a maior rede pluripartidária de políticos do Brasil ao dar as boas-vindas em 2021 a 80 novos integrantes, entre vereadores, deputados distritais e estaduais, vice-prefeitos e prefeitos. Essa conquista se consolidou em julho, com a adição de cinco deputados federais e um senador como novos membros. Agora, 10% do Senado (8) e cerca de 8% da Câmara dos Deputados (37) são formados por líderes RAPS, comprometidos nos seus mandatos com o desenvolvimento sustentável do país.

No total, 753 lideranças já fazem parte da RAPS, integrando 29 dos 32 partidos políticos brasileiros, de todas as regiões do país, em nível municipal, estadual e federal. Para comemorar este marco, conversamos com a diretora-executiva da rede, Mônica Sodré. Ela falou sobre a importância do pluripartidarismo em uma democracia, os impactos da pandemia no país e como as políticas nacional e internacional podem responder aos atuais desafios globais, em especial às mudanças climáticas.

1. Qual a importância de se tornar a maior rede pluripartidária do Brasil em um cenário tão polarizado quanto o que vivemos hoje?

A RAPS vem há quase uma década mostrando que o diálogo e a cooperação entre políticos diferentes são possíveis. A expansão da nossa rede de membros, que passa a ter agora 228 pessoas em cargos eletivos por todo o Brasil, sendo também 8% do Congresso Nacional, aumenta nossa responsabilidade, mas aumenta também nossa esperança de que nosso país possa sair do extremismo que tem dominado o ambiente político nos últimos anos. Nós acreditamos que uma democracia melhor se faz com lideranças políticas melhores, capazes de dialogar e colocar as diferenças de lado para encontrar soluções concretas para nossos desafios sociais, econômicos, políticos e ambientais.

2. Sabemos que a crise do coronavírus também jogou luz sobre a fragilidade das democracias em meio a momentos de exceção – inclusive a nossa. Como podemos sair fortalecidos dessa etapa?

No caso brasileiro, é impossível que haja uma democracia de qualidade sem que haja correção das nossas desigualdades. A pandemia escancarou o problema e vai demandar investimentos e compromisso de políticos e gestores públicos nas próximas décadas: teremos uma geração de crianças e adolescentes cujas oportunidades futuras de inserção e crescimento no mercado de trabalho estarão comprometidas. Teremos um aumento da procura pelo Sistema Único de Saúde advindo de pessoas que vão conviver com as consequências anatomofisiológicas da covid-19. E isso sem falar das milhares de pessoas que perderam não somente seus empregos, mas sua capacidade de voltar ao mercado de trabalho. Precisamos, nas próximas décadas, discutir seriamente um aumento da proteção social no país – via programas de transferência de renda ou outros, bem como promover reformas que melhorem a alocação de capital do Estado e reduzam a regressividade do sistema tributário atual, que pesa desproporcionalmente sobre os mais pobres.

O Congresso brasileiro tem um papel fundamental para ajudar o Brasil a alcançar uma economia de baixo carbono. Boa parte das emissões brasileiras de gases de efeito estufa advém de mudanças no uso da terra (44%) e o desmatamento é responsável por parte significativa disso (94%)”

Mônica Sodré, diretora executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS)

3. Governos e parlamentos do mundo inteiro têm repensado políticas públicas e incentivos econômicos a partir dos efeitos da pandemia. A transição para um cenário de baixo carbono e o enfrentamento às desigualdades de renda vêm tomando a pauta de diversas nações. Quais mudanças legislativas podem pavimentar esse caminho aqui no Brasil?

Uma pauta que poderia contribuir para isso é a necessidade de que, para receber recursos públicos, empresas apresentem contrapartidas ambientais. Ou que empresas com passivos ambientais não possam tomar recursos públicos ou privados. No entanto, não podemos esquecer da emergência a ser atendida: o parlamento hoje precisa atuar na direção de conter ampliação dos retrocessos ambientais. Para isso, legislações como a de regularização fundiária, hoje em discussão, não podem ser brandas com quem comete crimes ambientais, por exemplo.

4. Temos visto uma interação cada vez maior entre embaixadas e parlamentos, e entre parlamentos de diferentes países, no tratamento da temática ambiental, a exemplo do recente encontro entre líderes RAPS e embaixadores europeus e americanos. Quais oportunidades o Congresso brasileiro pode criar a partir dessas relações bilaterais?

O Congresso brasileiro tem um papel fundamental para ajudar o Brasil a alcançar uma economia de baixo carbono. Boa parte das emissões brasileiras de gases de efeito estufa advém de mudanças no uso da terra (44%) e o desmatamento é responsável por parte significativa disso (94%). Enquanto os países declaram suas ambições e metas climáticas, temos visto o Brasil perder espaço no cenário internacional por conta da negligência com nossos ativos ambientais. O parlamento federal pode, de um lado, impedir a ampliação de retrocessos ambientais barrando leis que possam implicar em menor proteção ambiental e, de outro, também pode auxiliar no avanço de “pautas positivas”: é o caso, por exemplo, do projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que prevê a regulação do mercado de carbono nacional. Ainda, é importante que o Congresso tenha um papel ativo na fiscalização da atuação do executivo, em especial na questão do desmatamento.

Os encontros entre parlamentares brasileiros e de outros países, bem como o encontro dos parlamentares brasileiros com as embaixadas, servem, entre outros motivos, para que se possa entender as movimentações em curso em outros países em relação ao tema (como o caso da União Europeia, que anunciou recentemente a taxação de carbono na fronteira) e adequar a produção da legislação doméstica ao “espírito do tempo”.

5. Nesse sentido, e diante das pressões internacionais pela proteção da Amazônia, a diplomacia climática pode ser uma seara mais frutífera na relação que nossas prefeituras e estados podem estabelecer junto a outros países e suas agências de fomento, por exemplo? No que podemos apostar?

A paradiplomacia é sim uma aposta importante e com a questão climática sendo colocada no centro das discussões econômicas, tende a crescer. É preciso lembrar que tanto na questão do combate ao desmatamento quanto na questão fundiária – que podem ser discutidas a partir do guarda chuva “mudança do uso da terra” – estados e governo federal dividem responsabilidades. Cabe aos estados, por exemplo, atuar em áreas sem destinação que estão fora das áreas federais. Assim, tanto estados quanto municípios precisam estabelecer suas metas climáticas, e seus planos concretos para mitigação bem como para adaptação, e há recursos internacionais que podem ser buscados para isso.

Aqui entra um outro aspecto: o compromisso do gestor público, prefeito(a) ou governador(a), com a temática e a necessidade de preparar suas equipes e secretarias para isso. É fundamental que o compromisso com a questão climática se traduza também nas peças orçamentárias dos entes subnacionais. A gente sabe sobre a prioridade de uma gestão pública ao olhar para onde estão destinados seus recursos.

Saiba mais sobre a RAPS.

Carmen Guerreiro

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