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“A Cúpula da Amazônia representa uma retomada do protagonismo da PanAmazônia nas discussões globais de clima”

Foto: IPAM/Divulgação

Nos dias 8 e 9 de agosto, Belém (PA) será sede da Cúpula da Amazônia, que vai reunir chefes de Estado dos oito países integrantes da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) – Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. O encontro busca retomar o diálogo regional, reforçar os laços entre os órgãos de governo e sociedade civil desses países e definir um compromisso de cooperação pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia. 

Diretor de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Eugênio Pantoja vem acompanhando desde o início as discussões para a preparação da reunião, que envolvem órgãos do governo, como o Ministério das Relações Exteriores e a Secretaria Geral da Presidência da República, além de uma rede de organizações da sociedade civil. O IPAM esteve ainda à frente da organização de eventos voltados para a construção de recomendações e soluções nos temas que serão discutidos no âmbito da Cúpula. Na conversa a seguir, Pantoja, que também faz parte da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia, detalha a importância da Cúpula e o que se espera deste encontro, visto como um ensaio para a COP 30, que também será sediada na capital do Pará, em 2025. 

Qual é a sua avaliação sobre a importância desta Cúpula?

A Amazônia é nossa peça principal no xadrez global, seja em termos de mudanças climáticas, de abertura e consolidação de mercado ou no âmbito da diplomacia internacional. Mas a Amazônia não é só Brasil. Daí a importância de um evento como esse, que chama os outros países para rediscutir a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). A Cúpula representa uma retomada do protagonismo do Brasil – e da PanAmazônia – nas discussões globais para se atender aos desafios climáticos. É também uma oportunidade desses países discutirem qual é o processo de desenvolvimento que vão construir daqui para frente. O encontro é importante para a região começar a definir quais os grandes temas e as estratégias que serão colocadas no âmbito das políticas públicas para uma construção coletiva de soluções para a sustentabilidade. 

Quais são esses grandes temas?

A redução do desmatamento acaba tendo muito destaque, mas por trás disso há uma série de temas a se discutir. A começar pela necessidade de planejamento e de ordenamento territorial, o que envolve a destinação de áreas que ainda não foram destinadas, a regulamentação de unidades de conservação, a demarcação de terras indígenas, a consolidação dos assentamentos rurais.

Um segundo ponto estratégico neste debate é a discussão sobre serviços ambientais, serviços do mercado de carbono e crédito de carbono, porque cada país tem um regramento, uma forma de atuar, características jurídicas próprias. É preciso haver um alinhamento, uma coordenação e um olhar integrado para a região como um todo.  

Outro ponto é a proteção das populações tradicionais, que viveram uma escalada da violência em todos os sentidos, de invasões de terras a perdas de direitos. Precisamos garantir os direitos desses povos ao território, à inclusão econômica, ao uso das suas terras.

E há uma agenda econômica a ser pensada em conjunto?

Talvez esse seja o ponto mais estratégico: o desenvolvimento econômico. Não adianta garantir comando e controle, combate ao desmatamento, direitos dos povos tradicionais, sem trazer uma alternativa econômica viável para a população amazônica, tanto do campo e da cidade, quanto das florestas. Precisa estar muito bem definido e claro qual vai ser a visão de desenvolvimento econômico que a região precisa. E há algumas premissas importantes. A primeira delas é prezar pela floresta viva, floresta em pé, ou com seus usos manejados de uma forma mais sustentável. É impossível também pensar em um desenvolvimento econômico da região desassociado das cadeias produtivas tradicionais, como a agricultura e a pecuária, que também precisam considerar processos mais sustentáveis.

Há ainda a importância de se pensar uma política de logística e infraestrutura que não seja somente para escoamento de produção, mas sobretudo para inclusão das populações. 

Financiamento foi um dos grandes temas da última COP. Também pode ter um peso na Cúpula?

Sim, o financiamento não só climático, mas para a sustentabilidade. É preciso construir mecanismos que sejam apropriados para a região amazônica em termos de garantias, de modalidades, capazes de atender às realidades e características da região em diferentes níveis de investimento, tanto nas cadeias produtivas, quanto na infraestrutura ou na estruturação de políticas públicas. 

Como foi o envolvimento dos países da região na preparação do encontro?

Colômbia e Peru talvez sejam os países mais próximos da discussão e que foram mais proativos. Tanto que a Colômbia promoveu um evento pré-Cúpula, em Letícia, que teve a presença do presidente Lula. 

Um atrativo importante para o engajamento dos outros países é que o mundo inteiro vai estar de olho nessa reunião, e certamente nos desdobramentos que ela vai apontar. Os países amazônicos vão ter cerca de dois anos e meio para fazer compromissos e entregas contundentes para reduzir as emissões e, ao mesmo tempo, incluir as comunidades, as populações indígenas e as pessoas da cidade nesse novo processo de desenvolvimento. 

O encontro ambiciona produzir uma declaração conjunta para ser levada a vários debates globais que estão por vir – o primeiro será a Assembleia-Geral da ONU, que ocorre em setembro. O que de fato deve sair deste documento? Há sinais dos pontos convergentes entre os países?

Acredito que a redução do desmatamento será o tema principal. O presidente Lula tem reforçado isso, com objetivo de alcançar o desmatamento zero até 2030 no Brasil. Também acredito que a proteção das terras indígenas e a garantia dos direitos desses povos serão pautas importantes, e que certamente vão permear toda a Cúpula. Assim como a segurança pública — sobretudo o combate ao narcotráfico — e a parte de investimentos, seja para financiamentos relacionados ao equilíbrio climático e redução de emissões, ou ligados à infraestrutura e logística. Em termos de desenvolvimento econômico, a bioeconomia também deve ser um debate central.

O que distingue esta edição da Reunião dos Presidentes dos Estados Partes no Tratado de Cooperação Amazônica? A participação da sociedade civil é um diferencial?

A participação social com certeza é um diferencial. Também é um indicador de que a construção das soluções para os desafios pan-amazônicos precisa da sociedade civil. A provocação que tem sido feita entre as organizações, inclusive, é de como podemos – enquanto sociedade civil – contribuir para as soluções dos desafios que serão apresentados. É importante que não sejamos só portadores de reivindicações, mas que também possamos ser portadores de caminhos, cada um com seus compromissos e naturezas institucionais de atuação. 

O Pará é a unidade administrativa responsável pelo maior desmatamento da Amazônia desde 1988. O quão simbólico é Belém sediar essa Cúpula?

Vejo como uma oportunidade extraordinária para o Pará, já que esses grandes eventos acontecendo em Belém — a cidade já abrigou a Conferência Pan-Amazônica — colocam a capital e o Estado em evidência global e favorecem um compromisso político pela sustentabilidade. A Cúpula também vai ser um evento teste internacional para que a cidade se prepare para sediar a COP 30, em 2025. 

Belém está se tornando uma cidade global, em termos de divulgação internacional, que se compara a capitais centrais na discussão ambiental como Paris, Estocolmo, entre outras. Acredito que isso é possível graças às mudanças na visão política de desenvolvimento do Estado. Muitas políticas que estão sendo colocadas atualmente visam a redução das emissões. 

Já houve uma redução drástica neste ano e isso se deu, principalmente, pelo favorecimento de um processo de desenvolvimento sustentável na perspectiva de descarbonização, de redução do desmatamento e de desenvolvimento integrado do agronegócio, junto com a valorização da floresta em pé. Esse momento e o ambiente político favorável fazem com que o governo do Pará assuma compromissos e possa se estabelecer como referência.

Fernanda Carpegiani

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