Manaus foi local de encontro do debate sobre sistemas alimentares globais e seu impacto para o futuro da humanidade. Promovido pela Global Alliance for the Future of Food, uma rede global de filantropias que promove reflexões sobre relações da sociedade com a produção, distribuição e consumo de alimentos, o evento colocou a região amazônica, com sua vasta biodiversidade e desafios únicos, no centro das discussões.
Mesmo com o potencial da região para impulsionar a bioeconomia, especialmente com produtos como açaí, guaraná e castanha, a participação amazônica no mercado global desses itens ainda é limitada. A importância de políticas públicas e iniciativas privadas em escala adequada foi ressaltada como fundamental para promover uma bioeconomia sustentável na região.
O encontro em Manaus não só trouxe à tona os desafios urgentes dos sistemas alimentares globais, mas também destacou o papel crucial das filantropias e das iniciativas locais na promoção de um futuro mais sustentável e equitativo para a Amazônia e para o mundo.
“Os desafios para que as iniciativas de bioeconomia hoje existentes ganhem escala são muitos. É preciso garantir assistência técnica e extensão rural, acesso a crédito e a instrumentos financeiros e acesso ao mercado. Sem essa última ponta, não há economia que se sustente”, acredita Renata Piazzon, diretora-geral do Arapyaú, que se dedicou ao tema em seu artigo de estreia no Estadão, em fevereiro. “À filantropia cabe criar as condições favoráveis para que essas iniciativas deslanchem, direcionando recursos, inteligência e inovação, em articulação no campo das políticas públicas e das práticas do setor privado.”
No fim do ano passado, um grupo de 25 entidades filantrópicas de todo o mundo divulgou documento (Cultivating Change: Accelerating and Scaling Agroecology and Regenerative Approaches) em que pedia que os investimentos da filantropia em agroecologia e iniciativas de regeneração fossem multiplicados por dez até 2040. Segundo o texto, uma transição para um sistema de produção agroecológico no mundo custaria entre US$ 250 bilhões e US$ 430 bilhões por ano. Atualmente, unindo setores público, privado e filantropia são investidos por ano US$ 44 bilhões. A Amazônia tem grande potencial para receber uma boa parte desses recursos.
A convite do Instituto Ibirapitanga, um dos nomes mais relevantes da temática de sistemas alimentares no país, e da própria Global Alliance, Renata Piazzon e Vinicius Ahmar, gerente de estratégia para Desenvolvimento Sustentável, representaram o Arapyaú no evento de Manaus. Eles puderam compartilhar as ações do instituto nas Amazônias.
“Tivemos profundas e desafiadoras conversas sobre o futuro dos sistemas alimentares e suas transições justas, inclusivas e sustentáveis. Participar deste grupo e dividir nossas ações nas agendas de cacau e bioeconomia no sul da Bahia e na Amazônia reforça o papel do instituto de estar conectado a redes transformadoras”, afirma Vinicius.
O evento também contou com a participação de lideranças amazônicas, como Valcléia Solidade, quilombola e superintendente de desenvolvimento sustentável de comunidades da FAS, e Rosi Vieira Teles, conselheira do Podáali, o primeiro fundo gerido e liderado por indígenas da Amazônia brasileira, além do procurador da República no Estado do Amazonas, Fernando Soave, que atua pelos direitos da população indígena. Os participantes puderam compartilhar suas perspectivas e experiências na busca por sistemas alimentares mais justos e sustentáveis na região.
Exemplos locais de incentivo a produtos da bioeconomia também foram apresentados, como a produção agroflorestal dos indígenas da etnia Mura, que se organizaram para que seus produtos fossem certificados e ganhassem mercado, ou a iniciativa com produtores familiares da Rede Maniva, um grupo formado por representantes de universidades e dos setores público e privado que promove há mais de 20 anos a agroecologia em todo o estado do Amazonas.