“Na relação humana com o meio ambiente não existe futuro individual, nem para pessoas, nem para nações. O nosso futuro é comum. Precisamos compartilhá-lo e desenhá-lo juntos.” A frase de Olof Palme, primeiro-ministro da Suécia, foi um marco da primeira Conferência das Nações Unidas, em 1972. Mas, no início deste mês, voltou a ser um norte na Estocolmo+50, encontro internacional realizado na capital da Suécia para marcar os 50 anos da conferência que colocou pela primeira vez o meio ambiente na agenda política global. O evento teve a participação de vários integrantes da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia.
Em cinco décadas, as palavras de Palme se desdobraram em conceitos importantes, como o “global commons” (que se refere aos recursos naturais compartilhados pela humanidade, como os oceanos, a atmosfera e o espaço), e também influenciaram, por exemplo, a criação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), conjunto de 17 metas globais desenhadas pelas Nações Unidas para serem atingidas até 2030.
É contraditório, depois de tantos avanços e acordos, a humanidade estar próxima de um ponto sem volta para os danos ambientais em vários sistemas, entre eles a Amazônia. No encontro, várias vozes deixaram claro a urgência de uma mudança radical, que passa por novos sistemas de governança, capazes de envolver a ciência, o mundo dos negócios, a sociedade civil e os governos”
Renata Piazzon, diretora executiva do Instituto Arapyaú e secretária executiva da Concertação.
Estocolmo+50 reforçou ainda um aspecto muito defendido pela iniciativa: a agenda ambiental precisa caminhar com a social. Nesta busca de novos modelos de desenvolvimento, a governança multistakeholder, envolvendo a ciência, o mundo dos negócios, a sociedade civil e os governos, é fundamental. “As conclusões do encontro estão muito de acordo com o que temos buscado na Concertação: atuação em rede e a construção de uma agenda integrada de desenvolvimento. Modelos de desenvolvimento precisam ser sistêmicos, com várias abordagens, que incluam saúde, educação, meio ambiente, entre outros, de maneira integrada e organizada.” (leia também o artigo: : “Por uma política de saúde na Amazônia”).
A leitura sobre o evento foi tema de artigo publicado no Reset. O texto – assinado por Renata Piazzon, Roberto Waack e Izabella Teixeira – defende ainda que todos os países devem ter uma corresponsabilidade para lidar com os bens comuns e que o Brasil, um dos atores mais relevantes nesse tabuleiro, precisa retomar seu protagonismo. Em entrevista ao Estadão, Renata, Izabella e Waack também discutiram as dificuldades que o país enfrenta para cumprir os acordos assinados na COP26 para zerar o desmatamento ilegal e cortar emissões, que seguem em alta.
Em um encontro em que o Brasil esteve bem representado por jovens ativistas indígenas e ambientais, Samela Sateré-Mawé, integrante de Uma Concertação Pela Amazônia e fellow do Instituto Arapyaú, reforçou a importância do protagonismo dos povos indígenas.
A gente buscou levar [para Estocolmo] uma visão decolonial do que é desenvolvimento, que é a proposta do envolvimento. A gente quer o envolvimento dos povos indígenas em tudo que tange nosso bioma. Se grandes empresas e investidores querem ter algum trabalho aqui na Amazônia, a gente quer ser consultado, quer estar nos espaços de tomada de decisão. Por muito tempo, tivemos muitas pessoas falando por nós: o que elas acham, o que elas pensam. Mas a gente acredita que nada é por nós sem nós.”
Samela Sateré-Mawé, integrante de Uma Concertação Pela Amazônia e fellow do Instituto Arapyaú em entrevista à Folha de S. Paulo
Samela destacou ainda o papel da internet para o fortalecimento da voz dos jovens indígenas: “É uma ferramenta que nós dominamos, mas nossos antigos não dominam ainda. (…) A internet mobilizou muitas pessoas para ajudar os povos indígenas. E está ajudando com as denúncias sobre o que acontece no nosso território. Estamos protagonizando a luta dos nossos pais e avós com as nossas novas armas, que são os celulares e a internet.”