O debate sobre o desafio de lidar com o nó das finanças climáticas globais ganha espaço com a proximidade da COP28, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O tema teve papel central em pelo menos dois fóruns internacionais realizados em setembro.
Na Cúpula do G20, em Nova Délhi, na Índia, a declaração final reafirmou a necessidade de US$ 5,9 trilhões para que os países em desenvolvimento cumpram suas metas climáticas até 2030. Essas nações recebem atualmente apenas uma pequena porção dos recursos destinados a projetos que impactam positivamente no combate aos desafios climáticos do planeta.
A dificuldade para que os países mais pobres enfrentem a mudança do clima foi debatida também durante o Finance in Common Summit, encontro mundial de bancos de desenvolvimento, realizado em Cartagena, na Colômbia.
O evento reuniu instituições que, juntas, somam mais de US$23 trilhões em ativos e são responsáveis por mais de US$ 2,5 trilhões em investimentos anualmente. Os bancos de desenvolvimento debateram com a sociedade civil o papel que podem ter no preenchimento dessa lacuna de recursos voltados ao enfrentamento climático em países emergentes.
As discussões aconteceram à luz de dados relevantes, como o fato de os países emergentes receberem só 27% dos investimentos necessários para endereçar os riscos relacionados às mudanças climáticas. Ou o fato de apenas uma menor parte desses recursos partir do setor privado. Quando se analisa o investimento por tipo de capital, em países ricos, os recursos privados respondem por 78% dos investimentos climáticos. Já nas nações em desenvolvimento, o capital privado é responsável, em média, por 40% dos recursos destinados a questões relacionadas ao clima.
Os dados integram um trabalho apresentado durante o encontro na Colômbia por instituições como o Arapyaú, o Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) e o iCS (Instituto Clima e Sociedade), além do próprio BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
O documento defende que os bancos de desenvolvimento podem aumentar o seu impacto ao se aliar à filantropia. Ao trabalhar lado a lado, os dois atores têm a possibilidade de aumentar a mobilização e dar escala aos investimentos que contribuem com o enfrentamento da questão do clima e com a busca pelos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), das Nações Unidas.
À filantropia cabe exercer alguns papéis que não se encaixam ou ficam à margem das prioridades de atores tradicionais, como governos, fundos globais e setor privado, direcionando recursos para regiões menos atendidas ou patrocinando soluções em caráter piloto que possam gerar inovações e ganhar escala.
A diretora-geral do Instituto Arapyaú, Renata Piazzon, foi uma das autoras do trabalho. Em sua coluna de setembro no Poder 360, ela argumentou: “na busca de alternativas que colaborem para o financiamento da transição para um modelo de desenvolvimento sustentável, resiliente e inclusivo, um dos pontos fundamentais é a união estratégica de diferentes tipos de capital, como o público, o privado ou o filantrópico, de modo a criar complementaridade entre eles, aumentando a escala e a eficiência dos investimentos”.
Uma das vantagens da união entre o capital filantrópico e o de bancos de desenvolvimento, segundo o documento, é o fato de unirem características diferentes, como a agilidade e propensão a testes da filantropia e os grandes montantes nas mãos dessas instituições. O trabalho conjunto seria possível com a adoção da modalidade de blended finance.
O trabalho cita como case o edital de blended finance do BNDES vencido pelo projeto do Certificado de Recebíveis Agrícolas (CRA) sustentável, criado para apoiar produtores de cacau que plantam em sistemas agroflorestais no sul da Bahia. O CRA sustentável tem o Instituto Arapyaú como um dos seus formuladores e traz, além da vantagem do financiamento, outros benefícios do trabalho conjunto, como a assistência técnica aos agricultores. É um exemplo de como o mecanismo de blended finance ultrapassa o potencial de financiar projetos ao integrar os ativos que cada um dos atores pode trazer, como posicionamento de mercado, troca de conhecimento e criação de redes colaborativas.