Cacau no sul da Bahia: uma nova narrativa ganha espaço

Cacau no sul da Bahia: uma nova narrativa ganha espaço
Foto: Patrícia Cançado

Da revista Globo Rural à publicação especializada em inovação Fast Company Brasil, de um podcast sobre a economia do futuro a um espaço para a discussão sobre crédito para agricultura familiar no site Poder 360, um assunto em comum: o cacau no sul da Bahia. São diversos os ângulos para se contar o esforço de várias iniciativas, entre elas o Instituto Arapyaú, para fortalecer a cadeia do cacau com a preocupação de melhorar a condição de vida das famílias produtoras, proteger a natureza e de desenvolver a qualidade das amêndoas.

É uma história bem diferente da do início  do século XX, no auge da cultura cacaueira no país, quando o Brasil — e especificamente o sul da Bahia — chegou a ser o segundo maior exportador de cacau do mundo, em tempos marcados pelos coronéis e jagunços retratados na obra de Jorge Amado. Ou da dos anos de 1980, época em que a disseminação da praga da vassoura de bruxa praticamente dizimou a cultura na região, dispensando milhares de trabalhadores e limitando a presença do Brasil no comércio internacional.

Para falar desse novo capítulo da história do cacau, o podcast Economia do Futuro, da jornalista Melina Costa, brasileira baseada em Berlim, entrevistou Thaís Ferraz, diretora do Arapyaú, e Ricardo Gomes, gerente de programa do instituto e também produtor de cacau. 

Em vez de uma monocultura, a cabruca — sistema agroflorestal em que os cacaueiros ficam à sombra de árvores como o jequitibá-rosa e pau-brasil, ajudando a preservar a Mata Atlântica. No lugar das grandes propriedades, pequenos e médios produtores, o que permite que a melhora da cadeia possa gerar impacto social. Mais do que aumentar a escala, ações para estabelecer o cacau sustentável como produto premium, estudos para compensar produtores pelo carbono estocado no modelo cabruca e a estruturação de modelos de crédito mais acessíveis. “Além de uma atividade econômica relevante (o estado da Bahia e o Pará são os maiores produtores de cacau do país), vemos a cadeia do cacau como um vetor muito importante de desenvolvimento sustentável para a região”, resumiu Thais.

Em termos de mercado, hoje cerca de 95% da produção está voltada para o cacau commodity. Mas são cada vez maiores os movimentos para agregar valor à produção, tanto pela qualidade inerente do cacau quanto pelo conceito de produção sustentável. Em uma cadeia globalmente associada a problemas como desmatamento e pobreza, empresas estão mais dispostas a pagar mais por um produto originado da forma correta. “A ambição do estado hoje não é ser um dos maiores produtores do mundo novamente, e sim se tornar referência em termos de qualidade e de conceito de produção sustentável”, complementou Ricardo. 

No sul da Bahia, uma região em que a maior parte dos produtores tem renda média bruta de menos de R$ 2 mil, baixa escolaridade e nunca teve acesso ao crédito, Thaís e Ricardo detalharam a experiência inédita do primeiro Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA) sustentável do país. Concebida em parceria pela ONG Tabôa, os institutos Arapyaú e humanize e o Grupo Gaia, a iniciativa juntou recursos do mercado financeiro e da filantropia em um modelo conhecido como blended finance.

O CRA Sustentável foi destaque também em julho no programa Bahia Rural, da TV Globo Bahia. Em um ano, o financiamento aumentou em quase 40% a renda média do agricultor familiar na região, além de elevar a produtividade e registrar uma inadimplência quase zero, explicou à TV o diretor executivo da ONG Tabôa, Roberto Vilela. “Conseguimos o crédito e oferecemos uma assistência técnica ao agricultor, um técnico agrícola que acompanha e ajuda a fazer o investimento”, disse. Para acessar os recursos, os agricultores precisam se comprometer a preservar áreas de proteção permanente.

No artigo Pacto social pela agricultura familiar no Brasil, publicado no portal Poder 360, a experiência do CRA — criado não para substituir, mas para ser uma alternativa às políticas públicas de financiamento rural — também serviu como exemplo de que ampliar o acesso a acompanhamento técnico e linhas de crédito reforça o desenvolvimento dos produtores. Além das garantias solidárias, adotadas nos créditos coletivos, e da possibilidade de pagamento semestral, de acordo com a safra do cacau, a inclusão de assistência técnica ajuda a explicar a baixa taxa de inadimplência do CRA, porque permite um acompanhamento próximo para o uso correto dos recursos.

Segundo o texto, escrito por Thaís Ferraz, Ricardo Gomes e Grazielle Cardoso, embora o número de agricultores familiares seja muito expressivo, esse segmento enfrenta dificuldades para acessar políticas públicas capazes de colocar a agricultura familiar em outro patamar, tornando-a competitiva e contribuindo para a soberania alimentar do país. Hoje, a cada 100 estabelecimentos agropecuários no Brasil, 77 são classificados como agricultura familiar. 

O projeto do CRA, conclui o texto, mesmo que em escala piloto, já confirma que a combinação de crédito e assistência técnica pode transformar a realidade da agricultura familiar, resultando em mais prosperidade e bem-estar com manutenção dos recursos naturais. Veja aqui mais sobre os resultados do primeiro CRA. Conheça também a Ju Arléo Chocolates, beneficiária do CRA, que aprimorou a qualidade do seu produto com o crédito e conquistou o segundo lugar no concurso da Academy of Chocolate, em Londres.

Em um contexto mais amplo, a Agência de Desenvolvimento Regional do Sul da Bahia, ou Agência Bahia, está se estruturando para estimular projetos que promovam crescimento dentro das vocações principais da região de forma sustentável. Para saber mais, conheça a sua secretária executiva, Mariana Sales e saiba mais sobre o seu projeto de elaborar propostas para os candidatos ao governo da Bahia (clique aqui).